Impossível começar esse texto sem dizer que CYCLE OF DISASTER, terceiro trabalho de estúdio do quarteto VÁLVERA, é um dos melhores álbuns lançados em 2020! Thrash metal vigoroso, brutal, agressivo, pesado, mas ao mesmo tempo, muito bem executado, gravado e produzido. Não á toa, o álbum figurou em diversas listas de Melhores do Ano nos sites e revistas especializadas. Não apenas em razão disso, pois ouvir o que as bandas têm a dizer sempre é muito bem vindo, mas pra falar sobre a carreira do grupo e dissecar um pouco mais deste mais recente trabalho, o REBEL ROCK trocou uma idéia com Glauber Barreto, vocalista e guitarrista da banda. Completam o time o guitarrista Rodrigo Torres, o baixista Gabriel Prado e o baterista Leandro Peixoto.
Por Sergiomar Menezes
Rebel Rock – Primeiramente, gostaria de agradecer a disponibilidade da banda em conceder essa entrevista. Apesar da pandemia, sei que o tempo acaba se tornando escasso para muitos. Mas já dando início ao papo, como surgiu a idéia de formar a banda? E quais eram as influências do grupo nesse início das atividades
Glauber Barreto: Fala galera da Rebel Rock, agradeço pelo convite. É uma honra ter esse espaço pra falar do Válvera. A ideia de montar a banda surgiu em 2010, eu e o Rodrigo já éramos amigos, sempre que a gente se encontrava ficamos falando de guitarra. Certo dia combinamos de fazer um som, tocar uns covers e colocar os amps valvulados pra fazer barulho. Acontece que nunca saiu cover nenhum, começamos uma Jam de coisas autorais, no final estávamos gravando riffs num PC velho do Rodrigo. Em 2010 nossas influencias eram Metallica, Iron Maiden, Motorhead, Raimundos... E cara a gente ouvia tudo e queria ser tudo rs, a gente tentava trazer coisas desde Charlie Brown Jr e Pearl Jam até AC/CD e Accept por exemplo. Éramos moleques querendo tocar tudo que gostávamos em um só som, pra beber e curtir, cagando para as regras que os xiita do metal seguem. No início esse era nosso único foco, curtir.
RR – Após a mudança para São Paulo, em 2013, dois anos depois sai “Cidade em Caos”, primeiro trabalho do grupo, cantado em português. Como foi o processo de composição e gravação do álbum? E cantar em português era a opção inicial, uma vez que, poucas bandas utilizam nossa língua, ainda mais dentro do Thrash Metal?
Glauber Barreto: A gente pensava que cantar em português seria maravilhoso, que a galera iria curtir uma banda fazendo metal na língua nativa. Talvez isso funcione para algumas bandas como Ratos de Porão e Project 46 por exemplo. Pra nós do Válvera não rolou tão bem. Tivemos muito preconceito, muita gente torcendo o nariz e fechando portas para nós, por cantar em Português. Nós tínhamos esse sonho de fazer o rolê todo BR mesmo, mas não da pra ficar socando ponta de faca, mudar foi necessário. A produção foi demorada, levamos alguns anos pra completar as 9 músicas, pois eu o Rodrigo que fizemos todas as composições e ainda éramos inexperientes, sofremos um pouco, mas sempre tivemos a vontade de se virar sozinhos, aprender, participar de tudo, até na mixagem e masterização. Tem que ser fominha nessa profissão, porque se você não entra de cabeça e fica foda, quem vai te respeitar? E gravar o primeiro álbum dentro do Mr. Som, por Pompeu e Heros do Korzus foi algo inexplicável, os caras são lendas e nós éramos uns moleques do interior perdidos na cidade grande, tivemos que calejar rapidamente pra dar conta.
RR – Dois anos depois, em 2017, é lançado “Back to Hell”, cantado em inglês. Foi uma opção da banda ou a repercussão do trabalho anterior, dentro do próprio grupo, não foi totalmente satisfatória? Pergunto isso pois muitas vezes, mesmo que a banda apresente qualidades, o público, ou boa parte dele, mostra certo preconceito com letras em português...
Glauber Barreto: Não temos vergonha do “Cidade em Caos”, mas foi um
álbum que não nos deu o fluxo esperado. Não éramos pesados demais pra tocar com
a galera do Thrash e nem leve demais pra tocar com a galera do Rock, isso sem
falar das letras em português. Ficamos de fora de vários festivais, perdemos
muito mais tempo explicando o trabalho do que tocando e crescendo. Isso tudo
tem que ser colocado na balança, porque a gente não largou família e emprego,
não viajou mais de 500km e tudo mais pra ir brincar de banda na capital. A
gente sempre quis crescer e figurar entre as bandas principais. Então foi meio
que uma decisão de sobrevivência, ou mudamos ou morremos. Mudar para inglês e
deixar o som mais pesado era inevitável para nós!
RR – E como foi a repercussão de “Back to Hell”, perante imprensa e público?
Glauber Barreto: A melhor possível, foi algo surreal. Começamos com o single “Demons Of War” que logo de cara foi considerado para muitos como um “Hino Do Metal Nacional”, lembro de ler essas coisas e ficava em êxtase. Ainda tivemos “The Traveller” e “Back To Hell” que tocaram em programações de rádio etc. Fizemos mais de 100 shows nessa turnê, fomos pra Europa, tocamos em 8 países. Cara, B.T.H. é pra nós da banda o nosso primeiro álbum de verdade, pois é ali que mostramos para que viemos, onde mostramos uma evolução enorme de álbum para outro.
RR – Esse álbum proporcionou à banda sua primeira tour na Europa, certo? Como foi essa experiência?
Glauber Barreto: Você consegue imaginar, o que é pra uma banda
saída do remoto interior de SP chegar na Europa, por conta de seu próprio corre
e trabalho? É uma das melhores sensações da vida, é inexplicável. Ficamos 22
dias na Europa, tocamos na Alemanha, França, Itália, Holanda, Polônia, Rep.
Tcheca, Bélgica e Eslovênia.
E sabe, ir pra lá mudou muita nossa cabeça, abriu a mente, deixamos de ver um
cenário nacional e começamos a analisar um cenário mundial. Então além de ter
sido a realização de um sonho, também foi uma faculdade pra todos nós.
RR – Acredito que toda essa bagagem serviu de background para o mais recente trabalho...
Glauber Barreto: Exatamente, foi isso que aconteceu. Nós evoluímos de acordo com o que nossa mente está trabalhando, essa vivencia deu vida ao trabalho novo. Em uma entrevista com nosso amigo e dono da Rádio Alemã, FCK FM, nós tivemos a ideia de fazer esse trabalho novo. Voltamos de lá com ainda mais “Sangue nos zóio”.
RR – Falando nele, “Cycle of Disaster” é um álbum maduro, pesado e brutal! Não á toa, figurou em várias listas de melhores de 2020, inclusive aqui no Rebel Rock e na minha lista de melhores do ano na revista Roadie Crew. Quando vocês gravaram o trabalham, já tiham a noção que haviam criado um disco desta expressão?
Glauber Barreto: Cara, esse álbum foi uma coisa louca. Foi a produção mais rápida que fizemos, desde concepção, temas, melodias, letras e tudo mais. A gente queria tanto mostrar pro mundo o que a gente estava sentindo e pensando depois da tour Europeia. Foi onde decidimos modernizar nosso som, começar a pisar em novos territórios, usar afinações mais baixas e tals. Eu não posso chegar e te falar que eu sabia que ele seria um álbum de tamanha magnitude assim, mas eu não posso negar que a gente sabia que ele era foda e melhor que o anterior! Sobre ficar entre os 10 melhores da Roadie Crew, Rebel Rock e de tantas outras listas brasileiras e estrangeiras é algo pra coroar de vez, temos muito orgulho desse trabalho e ele se tornou inegável no cenário, provando com nossa competência que o Válvera é uma das grandes bandas da nova safra!
RR- Como foi o processo de composição, gravação e produção do CD?
Glauber Barreto: O álbum “Cycle Of Disaster” foi gravado no Dual Noise Estúdio, mixado e masterizado por Rogerio Wecko, que é um monstro e nos ajudou bastante com as timbragens mais modernas. A gente queria mudar, usar afinações baixas e timbres de 2020 e muitos trabalhos vindo desse estúdio chamaram nossa atenção, exemplo disso os álbuns dos nossos amigos do Venomous e Laboratori. Então tendo em mente o que queríamos de sonoridade, juntamos com as idéias que adquirimos na estrada e na tour européia, foi questão de alguns meses compondo riffs e letras, pesquisando as histórias que usamos de tema e adaptando tudo pra música soar bem. Quando entramos no estúdio, tudo já estava pronto pra gravar. De verdade foi o álbum mais gostoso de produzir, gravar e até tocar ao vivo!
RR – “Cycle of Disaster” possui letras sérias, críticas e bastante profundas. A banda tem a preocupação de unir o som pesado e agressivo à letras que tragam reflexão aos fãs?
Glauber Barreto: Eu acredito que nosso trabalho vai além de entretenimento, nós músicos, somos a voz de muita gente, nós representamos o grito de quem não é ouvido, nós manifestamos questões e reflexões. Todas as nossas músicas tem um tema, tem um significado e se você prestar atenção, mesmo falando algumas vezes de assuntos antigos a gente aborda coisas atuais, exemplo disso é a “Glow Of Death”. Contamos a história da contaminação por Césio 137 que aconteceu em Goiânia em 1987, mas deixamos ali a mensagem de que a falta de preparo das autoridades, misturado com a ignorância de um povo pode acarretar em novos desastres. Em uma roupagem diferente, mas seguindo o rabo do cometa está aí o Covid de exemplo. Precisamos ter cuidado todo o tempo pra não reviver momentos infelizes que a nossa história já ensinou. E isso serve para todas as outras músicas. E pra quem quer conhecer as letras e diz que não entende nada em inglês, www.letras.com.br , tem todas as nossas letras com tradução. Vale a pena conferir!
RR – Fale um pouco das faixas que você considera as mais importantes e com uma mensagem mais forte presentes no álbum.
Glauber Barreto: Com certeza cada um de nós tem uma visão diferente sobre cada música, essa é a maravilha da arte, ser compreendida de formas diferentes, mas pra mim as mensagens mais poderosas estão na música “Cycle Of Disaster”, onde falamos da manipulação da religião, da pedofilia e abusos sexuais que padres e pastores fazem, falamos da maquina de enriquecer usando o nome de Deus em cima de uma fé que eles dizem que deve ser inquestionável. Outra música é “All Systems Fall”, onde falamos sobre o sistema que vivemos, a engrenagem da manipulação e corrupção política, onde somos eternos peões de um jogo que jamais ganharemos, da falsa sensação de justiça e liberdade. “Born On A Dead Planet” fala sobre o desmatamento, a falta de respeito pelo nosso planeta, o consumo exagerado e destruição que vai nos causar uma provável extinção e a “Bringer Of Evil” que fala sobre a maldade que o ser humano leva com ele, os atos hediondos e cruéis que as pessoas fazem, da intolerância, do preconceito e do lado obscuro que habita dentro de muitos. Pra mim essas são as mensagens mais poderosas desse álbum.
RR - 2020, apesar da pandemia, foi um ano em que muitas bandas tiveram que aprender a se reinventar, seja na divulgação dos trabalhos, seja na interatividade com o fã. Como foi o ano que passou para o Válvera?
Glauber Barreto: Não da pra esperar a pandemia passar pra gente trabalhar, no mundo de hoje que a internet é uma ferramenta tão poderosa, seria ridículo dizer que não dá pra fazer algo. Esse foi o ano que a gente fez várias lives batendo papo, fizemos 2 shows em live também, participamos com vídeos em vários festivais não só pelo Brasil, mas no mundo todo. Fizemos novos contatos, demos entrevistas diversas, trabalhamos nossa loja virtual e vendemos muitas camisetas e CDs. Tentamos trazer o fã pra mais perto, fizemos materiais de faixa a faixa pra explicar as músicas, fizemos lyric videos, conseguimos uma gravadora americana (Brutal Records), vencemos o concurso New Rock Bands elaborado por Kiss Fm e Top Link (Paulo Baron) e participamos de coletâneas virtuais, até fazendo uma versão de “Heaven’s On Fire” do Kiss. Apesar de ser um ano terrível por conta da pandemia, temos que agradecer por estamos todos com saúde e ainda conseguido trabalhar muito bem nossa música e imagem. Vamos sair da pandemia maiores do que quando ela começou.
RR – E o que esperar de 2021?
Glauber Barreto: Temos muitos planos! Eu e o Rodrigo fizemos alguns cursos de Marketing, Economia e também de música, vamos juntar com o resto da banda pra colocar todas as ideias alinhadas e em funcionamento. Assim que os shows voltarem a acontecer a gente caí na estrada e claro, esse ano começamos a gravar o novo álbum dos Varva!!! Vai rolar também uma coletânea inglesa onde vamos fazer uma versão valverizada de “Stayin’ Alive” do Bee Gees, imagina só que doidera vai ficar rs!
RR- Obrigado pela entrevista e deixo aqui o espaço para mandar um recado para os fãs!.
Glauber Barreto: Eu quem agradeço o espaço, poder falar do Válvera é um prazer imenso. Quero agradecer aos nossos fãs, eles sempre nos apóiam, sempre participam de tudo que a gente inventa e muitos deles se tornam amigos pessoais, acredite, o Válvera está virando uma família gigante rs. Continuem nos apoiando, continuem participando porque tudo é feito com muito amor e maldade pra vocês! Valeu demais!!!!