quarta-feira, 20 de maio de 2020

MINISTRY - AMMERIKKKANT (2018)


                                                                              Na ativa desde 1981 o Ministry construiu durante esses anos sua identidade musical dentro dos estilos em que visitou. Inicialmente com uma sonoridade bem enraizada no “New Wave” oitentista, com o With Sympathy (1981) apresentou aos admiradores um feeling sonoro que lembrava muito uma mescla de The Cure e Information Society e uma pegada mais eletrônica. Já no ΚΕΦΑΛΗΞΘ (1992) se nota o sensível redirecionamento da sonoridade. Sons mais agressivos, “samplers” nevrálgicos com toda intenção de causar desconforto, peso e vocal mais “rasgado”. A banda tinha feito a passagem para um estilo mais industrial, mas ainda apegado ao eletrônico introduzido na era new wave do grupo. Até que em 1999, já com o “Dark Side of the spoon” a transformação já tinha sido completada e a banda tinha incorporado totalmente o estilo Metal Industrial com todas as suas nuances e peculiaridades. E mesmo antes do Nine Inch Nails se transformar numa referência para o metal industrial, o Ministry já era responsável por grandes construções dentro do estilo. 

Eis que com o AMERIKKKANT (2018) a banda consolidou todo esse cozimento de palco e os mais de 39 anos de estrada, num Full-length digno de sua história vivida. Com letras e vocativos de protestos e provocações, AMERIKKKANT poderia muito bem se chamar “WE’LL MAKE MINISTRY GREAT AGAIN”. E já na abertura do álbum em “I KNOW WORDS” isso fica claramente entendido, quando remixa recortes do discurso da posse de Donald Trump. Ou basta olhar a capa do disco, criada por Sam Shearon que fica muito claro que o disco vem para retirar os curativos da ferida do “American Way of Life”. Uma estátua da liberdade sob um clima de crepúsculo e cobrindo o rosto, envergonhada e o nome referenciando a Ku Klux Klan (que Michael Moore, no documentário “Tiros em Columbine”, denuncia sem provas de que K.K.K. continua atuando sobre o novo nome de National Rifle Association) apedrejam o vívido espírito da manutenção do “estado das coisas”, de uma nação (re)conhecida pelo seu poder persuasivo e de ações polemicas. 

A nós meros mortais, cabe escutar a bolachinha e exercitar o pensamento crítico (ou apenas “bater cabeça”. Eis a beleza da arte, servir como deve, há quem admira). 
Ao longo do Cd, dadas devidas proporções, ouviremos nove clamores ao protesto. Nove chamados para o despertar e ao mesmo tempo, nove levantes contra o abuso de poder. Mas isso não é novidade, essa já é marca registrada das obras do Ministry. Porém a era Trump só poderia servir de ignição para esse estopim. Com grande relevância no cenário em que está incluído, o AMERIKKANT cumpre perfeitamente com o seu papel de erguer esse estandarte e de dar voz aos que não conseguem ser ouvidos. Não é necessário gostar de Ministry, mas é impossível desmerecer todo trabalho construído pelo grupo durante sua existência. 

Destaque para “Victims Of a Clown”, que coesa e muito bem equilibrada entre samplers e peso orgânico entregue pela banda, dá um recado com um gosto amargo para nação das listras e estrelas: 
“Angry man/ Septic tank/ Orange/ Toxic lies
Rejection of reality/ Cuts through like a knife...”
Ainda que peculiares ao estilo, alguns padrões de repetições dos samplers e remix tornam a audição um pouco cansativa. A exemplo de “Twilight Zone” que, mesmo pesada e com presença rica da guitarra do Sinhue Quirin, se estende por desnecessários (mais de) oito minutos. Talvez esse seja o único detalhe que torne o AMERIKKANT um daqueles discos que não se ouvem muitas vezes. Digo Talvez pois o Ministry já se aventurou em músicas mais extensas em outros discos e ao que parece isso não foi um problema. Se considerar que os samplers e “viradas” fazem parte do DNA do Ministry, o AMERIKKKANT é sim um belíssimo trabalho e que só pela temática vale muito prestar atenção. Mesmo que seja um tema evidente e “batido”, quando ninguém mais falar sobre os abusos, a sociedade terá adoecido por completo. 

No Brasil o disco chega pelas mãos de Shinigami Records. Vale conferir e tirar as conclusões pessoais e como diz o encarte do Cd:“só depois que perdemos tudo é que somos livres para fazer qualquer coisa” – Chuck Palahnik (de O Clube da Luta). Pois exercite a liberdade e curta o disco em alto e bom som. 

Uillian Vargas