terça-feira, 9 de junho de 2020

SCARS - PREDATORY (2020)


Sabe aquela banda que você coloca o CD pra tocar e de cara, reconhece sem pestanejar? Pois é... Podemos afirmar, sem a menor chance de errar que uma delas é o SCARS!! Poucos grupos conseguem imprimir sua personalidade dessa forma, e muito disso se dá pelos riffs de guitarra, algo bastante difícil, uma vez que o Thrash Metal não é um dos estilos mais diversificados que existem... Outro ponto que se torna bastante característico são os vocais que mostram uma dose extra de agressividade sem se tornarem maçantes. E agora, 12 anos após o último álbum (Devilgod Alliance - 2008), o grupo retorno com PREDATORY, um trabalho repleto de fúria, violência e agressividade, mas ao mesmo tempo técnico. Em 09 faixas (mais duas bônus) o grupo mostra que o tempo que ficou afastado não prejudicou em nada sua música. E se não soubéssemos que isso havia acontecido, passaria batido, tamanha a coesão e entrosamento do grupo!

Régis F (vocal), Alex Zeraib (guitarra), Thiago Oliveira (guitarra), Marcelo "Mitché" (baixo) e João Gobo (bateria) gravaram PREDATORY no renomado estúdio Loud Factory em São Paulo, sob a supervisão e produção de Wagner Meirinho (Warrel Dane, Torture Squad) o qual, nas palavras do próprio Alex, sabe exatamente como o Scars deve soar. Dessa forma, tudo no álbum tem uma pegada bastante característica, evidenciando o "modo" SCARS de fazer Thrash Metal. Cabe salientar que as duas faixas bônus presentes aqui, também foram produzidas por Wagner, mas contaram com as seis cordas de Edson Navarrette (substituído pouco tempo depois por Thiago). O vocalista Régis ressalta que "o ser humano é um 'super predador único' e que essa é uma temática muito forte, mas apesar de se tratar de um assunto vasto, o álbum não é conceitual". Nunca é demais lembrar que "The Nether Hell", EP de estréia do grupo lançado em 2005, era baseado na Divina Comédia de Dante Alighieri, mias precisamente no Inferno. Aliás, das duas faixas bônus presentes no CD atual, e que foram lançadas digitalmente em 2019, uma delas mantém uma ligação com este trabalho de estréia.

A faixa título abre o álbum com as guitarras de Alex e Thiago despejando riffs ríspidos, enquanto a dupla "Mitché" e João, mostram um entrosamento perfeito, garantindo uma base pesada e intensa, formando assim, a combinação perfeita para os vocais de Regis. E aqui, já fica uma constatação: só existe um único vocalista possível para o Scars. Impressiona o modo como Régis imprime sua personalidade, uma vez que consegue cantar de uma forma mais rasgada, sem nenhum tipo de restrição. Em seguida, "These Bloody Days" vem como um chute na boca do estômago. Com pouco mais de dois minutos, a faixa tem aquela velocidade típica do thrash metal oitentista, sem que soe datada ou fora de lugar. Na sequência, uma das melhores faixas do CD: "Ancient Power". Com um começo mais intimista, ela vem naquela pegada "Blacklist" do Exodus e até mesmo "Inner Self" do Sepultura. Que faixa, meus amigos! Clássico instantâneo, daqueles que não podem faltar em nenhum show do grupo. E, o mais engraçado nisso é que, em uma conversa que tive com o guitarrista Alex, essa faixa por muito pouco não entrou no disco! 

"Sad Darkness of the Soul" é outro grande momento, pois o peso das guitarras é descomunal, enquanto mais uma vez, a cozinha mostra serviço, principalmente o baterista João Gobo, que imprime uma pegada quase tribal, dosando de forma exata o peso e a técnica à favor da música. Mas o baixista não fica para trás, pois as quatro cordas adotam um alinha bastante densa durante a  execução do play. Já "The Unsung Requiem" é uma faixa instrumental, curta, que antecede "Ghostly Shadows", um momento mais próximo da Bay Area. Essa composição deixa exposta a classe e versatilidade de todos, pois ela navega entre momentos mais intensos e pesados, a outros onde uma linha mais trabalhada se faz presente. Assim como " The 72 Faces of God", onde é possível imaginar o mosh comendo solto durante sua execução nos shows!!

A penúltima faixa, "Beyond Valley of Despair" carrega consigo os vocais de Regis que apresentam uma dose maior de "dramaticidade" em sua interpretação. E talvez essa também seja uma das diferenças que o vocalista mostra em sua performance. Muito mais do que um vocalista, Regis é um intérprete, algo raro dentro do estilo. Escute e depois me diga se estou errado. A carga emocional passada durante a faixa é intensa e ele soube encaixar sua impostação vocal de form perfeita. O tracklist regular encerra com "Violent Show", que ao lado de "Ancient Pwer" ostenta o lugar mais alto do pódio em um álbum muito, mas muito acima da média. Veloz, instigante e agressiva, a brutalidade que emanam dos alto falantes faz com que se torne impossível ouví-la e ficar parado. Um encerramento perfeito!

Como bônus, o álbum traz duas faixas: "Armageddon" e "Silent Force". A primeira, mantém uma ligação e fechamento com o EP "The Nether Hell", contando como foi criado o Inferno. Essa foi a primeira composição do grupo após sua volta com essa formação e é um Thrash Metal seco, potente e sem meio termo. Se você é fã do estilo, vai curtir com toda a certeza. A outra faixa, "Silent Force" tem uma cara mais atual, apesar da personalidade da banda estar presente. Mas vejam bem, esse "atual" não significa moderno, e sim, com a pegada atual da banda, mais próximo das composições presentes no tracklist regular do álbum.

PREDATORY é um forte candidato a estar nas listas de melhores do ano. Seja pelas músicas presentes, seja pela apresentação gráfica, seja pela parte lírica, seja pela volta dessa formação. O que aliás, segundo Alex, é única que consegue realmente transparecer a musicalidade do SCARS. E ao término da audição, não há a mínima chance de se duvidar de tal afirmação! STAY THRASH!

Sergiomar Menezes








segunda-feira, 8 de junho de 2020

ELECTRIC MOB - DISCHARGE (2020)


Fale a verdade... Quando foi a última vez que você ouviu um álbum de estréia de uma banda brasileira que te deixou surpreso? A gente força a memória mas não consegue lembrar não é mesmo? Mas eu garanto que isso logo vai mudar. Basta apenas dar o play no primeiro álbum do quarteto parananense ELECTRIC MOB! Um som vigoroso, "rockão" daqueles que colocam um sorriso no rosto de quem curte o estilo. Pegada atual, mas buscando externar suas influências que vão desde o Hard Rock anos 70 até o metal mais moderno. E a banda conseguiu em DISCHARGE, mostrar uma personalidade única, coisa de gente grande! Não é pra menos que os caras assinaram com a FRONTIERS, uma das maiores gravadoras do mundo. Então, pronto pra viajar ouvindo o mais puro e visceral Rock n' Roll?

Renan Zonta (vocal), Ben Hur Auwarter (guitarra), Yuri Elero (baixo) e André Leister (bateria), apresentam 12 faixas onde a mistura dos vocais instigantes e técnicos, muito inspirado nos grandes vocalistas dos anos 70, encontra a combinação perfeita entre as guitarras inspiradas nos riffs clássicos dos anos 80, amparados por uma cozinha que traz consigo uma carga vibrante, resgatando o groove dos anos 90 e 2000. Como diz o próprio release da banda, tudo isso vem cimentado por uma abordagem contemporânea. E não há como negar. Uma banda entrosada e coesa, onde, mesmo com toda técnica e classe dos instrumentistas, o grande destaque vai para a voz potente de Renan. Não à toa, o vocalista teve uma participação de destaque no reality show "The Voice" da rede Globo. Mas, como citado anteriormente, todos os músicos apresentam uma qualidade ímpar, imprimindo sua sonoridade sem se preder a nenhum tipo de pré-conceito, deixando que o feeling se sobressaia de forma incontestável. 

"Awaken" é uma introdução que abre o álbum criando uma expectativa sobre o que ouviremos a seguir. E para nossa surpresa, um clima country invade "Devil You Know", faixa de trabalho do CD. Mas não se engane, pois o peso ganha destaque além de backing vocals muito bem encaixados, o que deixou espaço para Renan mostrar que não é apenas um vocalista, mas um grande intérprete. A guitarra de Ben Hur também merece destaque, pois traz uma atmosfera setentista (muito pelo uso do slide), mas também por resgatar o verdadeiro motivo da existência desse instrumento fazer música! Na sequência, "King's Ale" traz uma levada mais atual, com um ótimo groove, cortesia da dupla Yuri e André, que mostram que beberam muito da fonte do Living Colour, assim como a própria banda. "Got Me Runnin'" vem com sua atmosfera intimista, onde por alguns momentos me fizeram lembrar da musicalidade e genialidade dos Black Crowes. Aqui, Renan mais uma vez se destaca, pois seu timbre é bem característico, o que não o impede de alcançar as notas mais altas com muita desenvoltura. 

O Hard Rock toma conta dos alto falantes em "Far Off" (será coincidência?), uma faixa fortemente influenciada pela cena Hard dos anos 80. Mas não se engane, a pegada do Electric Mob é totalmente atual. Mais uma vez a banda da show de classe e bom gosto, uma vez que o timbre da guitarra de Ben Hur parece ter vida própria, tamanha a pegada dos riffs do guitarrista. "Your Ghost", na sequência, é uma balada com cara de blues, com destaque para o solo muito bem construído e inserido de forma perfeita na composição. E o peso com aquela dose esperta de groove volta a aparecer em "Gypsy Touch", uma faixa onde o lado mais heavy metal do grupo aparece com maior destaque. Renan canta com facilidade, num misto entre Jeff Scott Soto e Jorn Lande. O que convenhamos, não é para qualquer um, não é mesmo?

"123 Burn" também capricha no peso e groove, sendo na minha opinião, a faixa mais "diferente" do trabalho, pois navega por vários estilos, pois se não estou louco, até mesmo nuances de prog metal aparecem aqui, sem que façam com que a música se perca no caminho. "Upside Down" é aquele rock pegado, pra ouvir dirigindo em alta velocidade numa estarda deserta com o vento batendo no rosto. E se fosse possível, bebendo uma cerveja gelada! E tome groove e mais groove em "Higher Than Your Heels", mais um grande momento, onde até metais aparecem de forma condizente com a estrutura da faixa. E tente acompanhar Renan nos vocais. Ouso dizer que em certos momentos ele deve ter batido o recorde de palavras por segundo... "Brand New Rope" mostra uma face mais instigante enquanto " We Are Wrong" encerra o álbum com mais uma dose de peso, além de uma pegada Hard/Heavy digna de respeito!

DISCHARGE é um álbum que mostra uma banda honesta e verdadeira com sua música. Sem deixar se levar por modismos, o quarteto gravou um álbum que merece uma audição atenta por parte dos fãs de Rock n' Roll, seja qual for seu sub gênero favorito. Ao assinar com a Frontiers, o grupo provou que o talento pode vencer qualquer espécie de barreira, mostrando trabalho e perseverança. Sem vitimismos ou qualquer tipo de  desculpa, o ELECTRIC MOB apresenta não apenas um futuro promissor, mas sim brilhante, pois o presente já é uma realidade!!

Sergiomar Menezes



domingo, 7 de junho de 2020

LIFE IS GOOD... AS GOOD AS YOU WISH... UMA HOMENAGEM A ANDRÉ MATOS



08 de junho de 2020. Um ano sem a maior voz que o Heavy Metal brasileiro já teve a honra de compartilhar com o mundo... André Coelho Matos nos deixava para entrar na eternidade. Não que já não estivesse, uma vez que sua obra será para sempre lembrada pelos fãs. Mas aquele cara que começou moleque à frente do Viper, que um tempo depois mostraria ao mundo com o Angra que o metal melódico podia ter a influência da música brasileira, e como prova disso, nos brindou com o fenomenal Holy Land (1996), e que conseguiria, mais uma vez a frente de uma banda, o Shaman, gravar um dos melhores álbuns do estilo em todos os tempos, a saber, Ritual (2002), era muito mais do que um vocalista. Compositor, maestro e uma figura das mais simples e educadas das quais tive a oportunidade de entrevistar, André era um ídolo para este que vos escreve...

O primeiro contato com André se deu quando ouvi "Living for the Night", faixa clássica presente no não menos clássico Theatre of Fate (1989) do Viper. Lembro que um grande amigo gravou para mim em uma fita cassete, de um lado este álbum e, do outro, o Soldiers of Sunrise (1987). Me surpreendi por que, enquanto o Soldiers mostrava uma banda que buscava tocar como o Iron Maiden, no Theatre tínhamos um dos pilares do metal melódico. Mas em ambos os álbuns, uma coisa era recorrente o talento de André.

Mas não quero aqui traçar sua carreira, falar sobre seus álbuns, suas participações em inúmeros projetos. Isso, todos estão cansados de saber. Quero apenas prestar uma simples e singela homenagem a um dos caras que me fez gostar de Heavy Metal e me fez ver que no Brasil tínhamos (e temos) talentos que não deixam absolutamente nada a desejar ao que vem de fora. 

Há um ano atrás, lembro que quando começaram os boatos em um grupo do WhatsApp acerca de sua morte, achei que era mais uma das tantas fake news que invadem o nossos celulares diariamente. Mas infelizmente não era... Quando houve a confirmação, posso dizer sem a mínima vergonha, fiquei muito, mas muito triste. Foi como se um membro muito próximo da minha família tivesse falecido. Não á toa, no outro dia, quando realmente caiu a ficha, chorei. Sim, eu ns meus já "calejados" 43 anos de vida, chorei pela perda de um dos meus heróis.

Ainda mais quando lembrei que em 2014, quando eu escrevia para o portal de uma agência de publicidade de um grande amigo meu, que ficava no interior do Rio Grande do Sul, mais precisamente na minha cidade natal, São Lourenço do Sul, entrei em contato com o Costábile Salzano Jr, da Ultimate Press e solicitei uma entrevista com André, mas já esperando a negativa, afinal, era muita pretensão da minha parte imaginar que um dos maiores vocalistas de todos os tempos dispensaria um pouco do seu precioso tempo respondendo perguntas de um veículo sem nenhuma expressão na mídia especializada. Mas, para minha surpresa, cerca de 4 ou 5 dias depois, verifico meus emails e lá estava, não apenas a confirmação da entrevista, bem como a própria já respondida por André Matos! E o mais impressionante é que ele não se furtou de responder a nenhuma das questões enviadas, fossem ela a respeito do Angra (negando veementemente uma volta ao grupo), fossem a respeito do Symfonia e o mal estar com Timo Tolkki.

Abaixo, reproduzo tal entrevista, visto que ela não se encontra mais no site, e também como forma de homenagear André neste dia tão triste para os fãs de sua música e talento.

Para encerrar, agradeço imensamente por ter tido a oportunidade de dizer ao André o quanto sua música era importante para mim, como vocês mesmo poderão ler a seguir.

Descanse em Paz, André. Sua música seguirá nos guiando neste mundo cada vez mais seco e cruel.
Obrigado por toda sua genialidade, maestro!




REBEL ROCK - Bom, primeiramente, gostaria de dizer que é uma honra imensurável pra mim entrevistar o maior vocalista brasileiro de todos os tempos. Me faltam palavras pra descrever a alegria que estou sentindo. Agradeço de coração mesmo pela oportunidade!

ANDRÉ MATOS - Quem agradece sou eu: obrigado pelas palavras e pelo interesse!

RR - André, como tem sido a turnê de divulgação do The Turn of the Lighs em conjunto a comemoração dos 20 anos do Angels Cry? Está dentro daquilo que você imaginava?

AM - Foi além do que se imaginava. Da mesma forma que a reunião do Viper no ano de 2012, quando tocamos ao vivo os primeiros álbuns na íntegra. E foi justamente ali que nasceu a ideia de uma turnê não apenas de lançamento do último disco, mas também de comemoração aos 20 anos do Angels Cry, executando-o também na íntegra. Muitas bandas têm feito tours retrospectivas e foi a primeira vez que fizemos algo parecido. Estamos encerrando o ano e nem parece que já se passaram mais de 30 shows desde a primeira apresentação.

RR - Como foi pra você revisitar este clássico do metal nacional na íntegra? Creio que apesar de sua capacidade técnica, deva ter sido extremamente cansativo, pois no mesmo show você executava também músicas de sua carreira solo e do Viper...

AM - Na realidade, como vocalista, quanto mais longo o show, melhor. E optei por deixar o Angels Cry para a segunda parte do concerto, justamente por isso: ao contrário do que se pensa, é mais fácil executar partes tecnicamente complicadas quando o corpo está aquecido. E isso vale para qualquer instrumentista, não apenas para os cantores. Foi um desafio no início, mas agora posso afirmar que me sinto 100% à vontade com o repertório.

                                                                           ANGRA

RR - Passados 20 anos, como você avalia hoje a importância de Angels Cry para o cenário nacional e internacional ? Você considera ele seu melhor trabalho com o Angra?

AM - Foi um álbum de extrema importância  - e continua sendo. Vejo tanto nas composições como nos arranjos todo o potencial que a banda trazia naquele momento, e que de fato se desenvolveu nos trabalhos seguintes. Ainda assim, pessoalmente, considero o Holy Land como sendo o melhor trabalho junto ao Angra.

RR - Analisando seus três albuns solo - Time to be Free (2007), Mentalize (2009) e The Turn of the Lights (2012), qual deles é o seu preferido? E por qual razão?

AM - Esta é uma pergunta mais difícil, porque ainda não há o distanciamento necessário para conseguir analisá-los separadamente um do outro. Acho que todo álbum tem seu tempo de maturação; o tempo dirá qual o melhor, se é que há melhor. De qualquer forma, a resposta será sempre subjetiva e tenho total respeito pela opinião do público - que pode preferir este ou aquele álbum, independente de ser o mais recente ou não.



RR - E o retorno do Viper, André? Como foi pra você tocar novamente com a banda que começou tudo isso? Podemos esperar por algum material inédito, ou ficaremos apenas nessa turnê de reunião e no lançamento do DVD?

AM - Difícil prever o futuro; nós completamos a meta que havíamos estabelecido: realizar a tour e gravar um registro ao vivo. Foi uma experiência única; uma grande emoção em poder reviver aqueles primeiros passos - e, ao mesmo tempo, notar o quanto o Viper era inovador e original na sua época. Tanto é que as músicas funcionam bem até hoje; são atemporais e fazem a cabeça de fãs de todas as idades. Por enquanto, estamos na espera do DVD, que já se encontra praticamente terminado. E, no caso do Viper, o melhor a se fazer é não programar: o que tiver de acontecer, acontecerá no momento certo, como foi em 2012.

RR - O show do Rok in Rio, mostrou antes de mais nada uma banda feliz por estar reunida novamente. Como você viu esse momento histórico pro heavy metal brasileiro, que além de contar com a apresentação do Viper, teve também músicas de sua carreira solo? Particularmente, acho que o Viper deveria ter tocado no Palco Mundo. Não só pela qualidade, mas também pela importância no cenário...

AM - Quem decide a questão dos palcos é a produção, de acordo com suas próprias diretrizes e, pra ser sincero, não senti falta de tocar no palco Mundo desta vez: fomos super bem tratados pelo pessoal do Sunset e só tenho a agradecer a oportunidade de ver esse sonho realizado. Acho que, devido à repercussão positiva do nosso show, possivelmente tenhamos conquistado  a confiança do Festival e, independente do palco, o que importa é estar lá e conseguir passar bem a mensagem. A única coisa que eu desejaria seria fazer um show um pouco maior - mas isso certamente acontecerá caso sejamos cogitados para alguma próxima edição.

                                                                             VIPER

RR - Após sua saída do Angra, você formou o Shaman, que na minha opinião lançou um dos melhores álbuns nacionais de todos os tempos, Ritual (2002). Era exatamente isso que você buscava quando resolveu sair do Angra? Também nesse grande álbum "descobrimos" o grande guitarrista que Hugo Mariutti é.

AM - Sem dúvida, foi o "debut" do Hugo, que é meu grande parceiro até os dias de hoje. A proposta do Shaman era mostrar que poderíamos continuar fazendo música verdadeira, sem a necessidade de seguir os passos anteriores no Angra; os estilos diferiam bastante e até mesmo a formação da banda mostrava isso. Foi uma ascensão meteórica; em menos de um ano estávamos na televisão e nas paradas das rádios em todo o Brasil, era algo que não esperávamos. Isso teve um lado negativo, que foi o fato de a banda tornar-se tão conhecida no Brasil (e, por consequência, ocupada) - que acabamos deixando o exterior em segundo plano. Ritual é considerado pela maioria como o melhor álbum do Shaman, e talvez o seja, em função da variedade de influências e elementos - mas não deixo de salientar que o Reason é um dos álbuns mais bem produzidos de toda a carreira; ele possui uma sonoridade única.

RR - Aqui, eu preciso lhe dizer algo completamente pessoal. Em 2006 eu e minha esposa resolvemos nos casar, tanto no civil como na igreja. E sabe, tem que escolher uma música para entrar na igreja.. Escolhi Fairy Tale. Com isso, posso assim dizer que a sua música ficará pra sempre marcada na minha vida.

AM - Pois digo que vocês não foram os únicos. Jamais imaginei tal uso para uma composição minha, mas me deixa deveras honrado saber que ela é a opção de muitos casais nesta hora tão importante e decisiva da vida. Poder estar presente, mesmo em forma de música, é um privilégio: sinal de que em algum momento de minha carreira, consegui compor uma peça que entrou no rol dos grandes clássicos (Wagner, Mendelssohn, etc), os quais geralmente são a escolha comum para este tipo de ocasião. Perdi a conta de quantas pessoas relataram o mesmo fato, e é algo bastante gratificante. Por isso, também, é uma música que geralmente não pode faltar no set list de qualquer um de nossos shows.

                                                                          SHAMAN

RR - Você esteve em três bandas extremamente importantes (Viper, Angra e Shaman), em inúmeros projetos também. Quando que você decidiu que era a hora de partir pra uma carreira solo?

AM - Quando percebi que não havia outra alternativa. Nem chegou a ser uma opção: foi praticamente a única saída para continuar a carreira. Tive diversos problemas burocráticos, empresariais e jurídicos no passado envolvendo direitos autorais e disputas pelos nomes das bandas (salvo o Viper) - e decidi dar um basta nisso. De início não foi tarefa fácil. Mas com o tempo, se provou mais lógico e transparente dessa forma. Às vezes, ainda me pego estranhando o fato de que as pessoas vão assistir a um show cuja banda carrega o meu próprio nome: nesses momentos, a responsabilidade em função da qualidade pesa bastante. 

RR - Acho que ter uma banda com seu nome é uma grande justiça a toda a sua carreira.

AM - Não foi pensado desta forma; como disse, foi a única alternativa restante. Não faria mais sentido voltar com um novo nome de banda, isso não traria qualquer credibilidade. Ao mesmo tempo, acho que o grande ganho que se teve foi justamente o fato de, numa banda solo, você poder revisitar toda a sua carreira musical, do início ao fim, sem correr o risco de não parecer autêntico. É uma obra que lhe pertence. E, além disso, ainda há a possibilidade de compor coisas novas - já estamos no terceiro disco solo! Desta forma, me sinto bem mais livre para interpretar e também para criar.



RR - Em 2011 foi lançado o álbum In Paradisum do Symfonya, banda que contava com você nos vocais, Timmo Tolki na guitarra, Jari Kainulainen no baixo, Mikko Harkin nos teclados e Uli Kusch na bateria. Ou seja, um super time de músicos. Mas o projeto não vingou comercialmente. Por qual motivo isso aconteceu?

AM - Na minha opinião, vingou muito bem musicalmente. Talvez não tenha vingado comercialmente à altura do que o Timo esperava. E isso foi uma pena, pois acho que era um projeto que tinha um belo futuro pela frente - sem grandes pretensões; apenas de fazer o bom e velho metal melódico como todos sabemos fazer. Para mim foi um grande orgulho trabalhar com esse time de músicos e estar junto a eles; aprendi bastante nessa produção. Lamentavelmente, o Timo resolveu desfazer a banda da mesma forma como a fez. E nós, ainda que bastante surpresos, nada pudemos fazer para impedí-lo. Me lembro que na época ele chegou a citar que iria abandonar a carreira musical para sempre, mas não parece ter sido o que aconteceu...

RR - Li em uma entrevista recente de Timmo Tolki que ele disse que não trabalharia mais com você.

AM - Veja bem, eu não guardo qualquer rancor do Timo. Acho ele um dos maiores músicos com quem já trabalhei, o cara tem um talento nato. Infelizmente, ele também sofre de outros problemas que o deixam instável. E com isso torna-se uma pessoa difícil - ainda que, durante todo o período em que estivemos juntos em estúdio trabalhando, nos entendemos muito bem e houve zero atrito. A mudança de atitude só veio meses depois. E, nestes termos, acho que eu também pensaria duas vezes em voltar a trabalhar com ele. Mas digo isso sem nenhum sentimento ruim: torço para que ele se estabilize e que, finalmente, consiga fazer algo definitivo em sua vida. Seria uma pena que um talento desses caísse no esquecimento em função de causas externas com as quais ele próprio parece não conseguir lidar.

RR - Falando agora do Angra. O que você achou da escolha de Fabio Lione para o posto de vocalista da banda? Acho ele um excepcional vocalista, mas não para o Angra...

AM - Bem, recentemente já causei muitas polêmicas ao revelar algumas opiniões pessoais acerca do assunto Angra. Quanto ao Fabio, é um excelente vocalista e ponto. Também o admiro e respeito como pessoa; nunca me esquecerei do dia em que ele viajou 500km de carro apenas para ir assistir a um show que iríamos fazer do outro lado da Itália. Desejo o melhor ao Fabio, seja no Angra ou não.

RR - E se te chamassem pra apenas um show em comemoração aos 20 anos do Angels Cry?

AM - Isso chegou a acontecer, mas sinceramente, não existe a sintonia necessária e, por mais vantajoso que pudesse vir a ser comercialmente, prefiro seguir a minha consciência, em vez de tentar "atuar" em frente ao público. Eu não seria capaz disso, em tais circunstâncias. E, para mim, esta é a essência da música e da arte: se não é feita com verdade, não vale a pena.

RR - E o futuro, André? O que podemos esperar? Há planos para um dvd da banda solo? Mais shows?

AM - O futuro nos aguarda agora, dia 15 de dezembro, domingo próximo, no Carioca Club, em São Paulo. Será o encerramento de um período de dois anos de atividade quase ininterrupta e estamos preparando um concerto sem igual, com várias surpresas-  além, é claro, do repertório que deixará saudades. É a última oportunidade, portanto espero ver toda a nossa galera reunida para essa festa antes do fim do ano. Daqui pra frente nem nós sabemos; estamos 100% focados nesse show e, depois de um merecido descanso, traçaremos então novas rotas para 2014!

RR - André, gostaria novamente de agradecer pela disponibilidade em nos atender. Quero dizer novamente que tua música é muito importante na minha vida. E pode ter certeza, que continuará sendo. Deixo aberto esse espaço final pras tuas considerações finais. Um grande abraço!

AM - Quero deixar meus agradecimentos a todos os que comparecerem nesta extensa tour. Foram momentos muito especiais, que não se apagarão de nossas memórias! Obrigado.


Sergiomar Menezes