Quem viveu a cena Heavy Metal nos anos 90 sabe como o Dimmu Borgir foi relevante naquela década e na seguinte. Convenhamos, essa relevância perdeu um pouco o sentido nos dias de hoje, já que de 2011 pra cá, apenas 1 novo álbum lançado em 2018; o que é muito pouco para uma banda renomada e com fãs tão assíduos como o Dimmu Borgir. Precursores do Symphonic Black Metal, podemos dizer que a banda criou um novo estilo, hoje em dia tão praticado por muitas e muitas bandas por todo o planeta. Tive a oportunidade de vê-los ao vivo no Credicard Hall, em São Paulo, em 2004, com a banda no auge, e sem exageros foi um dos grandes espetáculos que assisti na vida, transformando um show de Metal Extremo quase que em uma peça teatral.
Com a brusca mudança do lineup ocorrida no final dos anos 2000, a banda parece ter sentido o baque e desde então, fixou-se como um trio: Shagrath (vocal, baixo e teclados), Silenoz (guitarra) e Galder (guitarra). Músicos contratados para gravar baixo, teclados e bateria nas apresentações ao vivo chegam a colocar um pulga atrás da orelha dos fãs já que chegamos a nos perguntar se a banda voltará aos seus melhores dias em algum momento. Só o tempo dirá!
Recentemente, disponibilizaram o EP “Inspiratio Profanus” que nada mais é do que a reunião em só lançamento de todas as covers feitas até hoje, sejam elas originalmente lançadas originalmente no Japão, lançamentos especiais ou então nos EP’s. São dez os trabalhos de estúdio da banda, isso contando duas vezes o lançamento de “Stormblåst” no qual detalharemos abaixo.
O REBEL ROCK RESEARCH traz aqui a discografia da banda do início sem grandes pretensões, passando por seu auge e depois a (ligeira) queda. Será que eles ainda tem lenha pra queimar?
For All Tid (1994)
“For All Tid” é um grande trabalho de estreia mas peca na produção tosca e crua algo que a própria banda admite, e não é de hoje. Duas das faixas deste trabalho apareceram regravadas no EP “Godless Savage Garden” (1998) com uma qualidade sonora inacreditável que as vezes podemos até duvidar que tratam-se das mesma faixas. Gostaria de entender o porquê da banda não regravar integralmente este trabalho assim como o fez com “Stormblåst”. Outro ponto a destacar são as letras em norueguês o que diferencia ainda mais seus primórdios em relação à outras bandas da cena que se espalhavam pelo planeta naquele momento. Destaque para “Under Korpens Vinger”, e “Glittertind”. Se você é iniciante na banda é melhor deixa-lo por último. Se fosse regravado, faria um grande estrago na cena. Que venha...
Eonian (2018)
O mais recente trabalho completo do Dimmu, “Eonian” viu a luz do dia quase 8 anos após o lançamento de seu antecessor e obviamente veio gerado por muita expectativa, afinal o que a banda poderia oferecer de tão novo e complexo após um hiato deste tamanho? Talvez por gerar este tipo de sentimento nos fãs, “Eonian” foi até certo ponto decepcionante. Muito dizem que a banda transformou-se em um Nightwish com vocal gutural e apesar do aparente exagero, a falta de peso deixou no ar esse tipo de especulação. Mas há sim bons momentos como “Ætheric”, “Lightbringer”, “I Am Sovereign” e o lindo epílogo instrumental “Rite of Passage” que soa quase como uma canção de ninar com ares demoníacos. Como singles, a boa “Interdimensional Summit” e a fraquíssima “Council of Wolves and Snakes” deram de forma antecipada o tom de que os fãs das antigas poderiam torcer o nariz. Não é ruim, mas poderia e deveria ser melhor! Próximo...
Abrahadabra (2010)
Antes de sair, “Abrahadabra” já veio com aquela desconfiança padrão já que o line up se dissolveu após “In Sorte Diaboli”, e o trio formado por Shagrath, Silenoz e Galder tomaram conta de tudo. O tecladista Mustis que foi um integrantes a deixar a banda fez muita falta neste disco. “Gateways” foi o principal single, “Dimmu Borgir” (a música) é sem dúvidas a melhor. Recentemente a banda lançou o single “Perfect Strangers” que é como não podia deixar de ser, é cover do Deep Purple, faixa esta que saiu como bônus da edição japonesa do álbum. Outro cover, “Dead Men Don’t Rape” (G.G.F.H.) é daqueles dispensáveis. O álbum foi lançado fisicamente em diversos formatos com faixas bônus diferentes para cada uma delas. No geral sobrou melodia, orquestrações, ótimas letras mas faltou peso, potência, velocidade e maldade. Disco que não irá mudar a sua vida mas é bom!
Stormblåst (1996)
Assim como o trabalho inaugural de 1994, “Stormblåst” é totalmente cantado em norueguês o que por si só já torna a assimilação do trabalho um tanto mais difícil. Mas quem se importa se ao apertar o play já nos deparamos com uma das mais maravilhosas intros da história da música em “Alt Lys er Svunnet Hen” que supostamente já havia sido, em partes, criada pela banda britânica de Hard Rock, Magnum. Mas não é só isso! A faixa título também é especial com aquele ar meio psicodélico na parte final instrumental. O ar mais diabólico fica por conta de “Da den Kristne Satte Livet Til” (Quando o cristão perdeu sua vida) sendo esta a mais rápida de todas. Ah, e tem a instrumental “Sorgens Kammer” que de acordo com declarações posteriores da banda, teve sua melodia vinda de um jogo de vídeo game através do então tecladista Stian Aarstad. Atualmente este álbum está dificílimo de achar em mídia física e nos serviços de streaming segue ausente. Que pena!
Stormblåst MMV (2005)
“Death Cult Armageddon” lançado dois anos antes foi um estouro. A banda estava na ponta dos cascos e assim, mais do que repente, os remanescentes da formação original, Shagrath e Silenoz, anunciaram que regravariam na íntegra o segundo disco da banda sem envolver os demais integrantes no projeto. A explicação para tal, foi a tentativa de reaver o espírito e a aura daquele momento e por não terem vivido o momento inicial, optaram por deixá-los (Galder e ICS Vortex) de fora; Hellhammer e Mustis ficaram apenas como músicos de apoio. Se isso não tivesse acontecido, o resultado final poderia ter sido melhor? Infelizmente nunca saberemos, mas fato é que a produção ficou, diferentemente de outrora, muito boa. Mas apesar de ser uma regravação há sensíveis mudanças em algumas faixas: “Alt Lys er Svunnet Hen” perdeu um pouco (ou muito!) do seu charme com a nova intro, já que a original foi removida possivelmente devido a direitos autorais, mas ainda assim agrada. “Sorgens Kammer” foi substiuída por “Sorgens Kammer – Del II” que se transformou no principal hit deste trabalho, e ainda há uma faixa adicional inédita, a insana “Avmakstlave”. Há quem prefira o original, há quem prefira a regravação (que é o meu caso), mas fato é que parecem discos diferentes e pode sim haver espaço para ambos em seu coração. Que bom!
Spiritual Black Dimensions (1999)
“Spiritual...” trouxe uma mudança que viria a ser muito marcante nos álbuns seguintes: a presença de ICS Vortex (aqui ainda apenas como apoio) com seu famoso vocal limpo tão característico e tão querido pelos fãs. Aqui ele aparece em 4 faixas, impossível de não notar. Também trouxe outra estreia, o tecladista Mustis que citamos anteriormente, como uma das principais veias criativas do período mais dourado do Dimmu. Tem a ótima “Dreamside Dominions”, a sombria “The Promised Future Aeons” e a maligna “The Insight and the Catharsis” que faz com que seja impossível não vibrar com as vozes limpas de ICS Vortex nos segundos finais da música. Versões mais recentes trouxeram a faixa bônus “Masses for the New Messiah” que não dá pra entender o porquê de não ter sido lançada inicialmente. Se não atingiu o brilhantismo do lançamento anterior, abriu portas e escancarou a trilha para o Dimmu chegar ao estrelato na década seguinte.
In Sorte Diaboli (2007)
Não consigo entender muito bem porque tanta gente torce o nariz para esse excelente trabalho. A abertura com “The Serpentine Offering” é clássica e tem um clipe muito bem produzido mostrando que o Dimmu ainda era prestigiado dentro da Nuclear Blast. Outro clássico é “The Sacrilegious Scorn” onde ICS Vortex arrepia o ouvinte cantando o verso “My word and world holds ground and is real! / Your world is like floods of poisoned water / A language spoken with spit from different tongues”. Os vocais limpos de Vortex aparecem pouco neste disco, talvez já dando pistas de que internamente, o clima não era dos melhores. Em “The Sinister Awakening”, Mustis é o destaque mais uma vez com seu piano formador de caráter. Um pecado foi o lançamento em versões diferentes na Europa, USA e Japão cada um com faixas bônus diferentes que levou colecionadores (me incluo nessa) ao desespero. Se não tem o brilhantismo dos álbuns que estão em nosso pódio, é uma obra indispensável aos fãs. Excelente!
Death Cult Armageddon (2003)
O Dimmu Borgir estava no seu mais absoluto auge. O line up inaugurado no trabalho anterior parecia perfeito, nada era capaz de abala-los. “Death Cult...” é de uma criatividade, magnificência e pompa que a imensa maioria das bandas virtuosas de Prog Metal não são capazes de atingir. O maior hit da carreira do Dimmu Borgir, “Progenies of the Great Apocalypse” é uma composição de Mustis que consegue ser super pesada e ao mesmo tempo, atingir pessoas não tão afeitas ao estilo. É a “Fear of the Dark” do Dimmu Borgir. Outro ponto a destacar são duas faixas cantadas em norueguês (“Vredesbyrd” e “Allehelgens død i Helveds rike”). Os arranjos orquestrais estão mais presentes ainda em faixas como “Blood Hunger Doctine” e “Eradication Instincts Defined”. “Heavenly Perverse” conta com a participação do icônico Abbath (ex Immortal) fechando o tracklist regular cheio de melodia que até parece uma faixa do Immortal. Se não chega a ser tão pesado quando seu antecessor, é o disco mais grandioso em termos de arranjos e composições intrincadas cheias de variações. Esses adjetivos podem soar um tanto quanto audaciosos demais mas ouvir o disco na íntegra é uma experiência única e a cada nova audição, algo novo pode ser descoberto. Soberbo!
Puritanical Euphoric Misanthropia (2001)
Possivelmente o mais famoso disco do Dimmu Borgir, aquele que os levou ao estrelato chega ao nosso 2º lugar. Sei que esse o preferido de muita gente, mas regras são regras e precisamos escolher uma ordem de preferência. “Puritanical...” escancarou ao mundo o Symphonic Metal que tanto falamos de forma brutal e maligna. O disco também inova ao iniciar e terminar seu tracklist básico com faixas instrumentais e com arranjos orquestrais. “Kings of the Carnival Creation” foi eleita por Silenoz não a muito tempo como a melhor composição da carreira do Dimmu e não ousarei discordar. Outro dos grandes hits é “Puritania” com seu flerte discarado ao Nu Metal, mostrando que a banda sabia sim, experimentar outras viagens musicais. “Blessings Upon the Throne of Tyranny” e a quase Thrash Metal “The Maelstrom Mephisto” também merecem uma audição mais apurada do ouvinte iniciante. E como não destacar o fabuloso cover de “Burn in Hell” do Twisted Sister e adivinhem só quem é o destaque com sua voz limpa? Nem preciso dizer né? Recentemente, o trabalho foi relançado nos formatos físico e digital em versão remixada e remasterizada o que comprova que a própria banda, considera este, seu trabalho mais influente. Obrigatório!
Enthrone Darkness Triumphant (1997)
Quando enfim o Dimmu Borgir resolveu saltar as fronteiras da Noruega e buscar o mundo, o trajeto inicial escolhido não poderia ter sido melhor. A chegada à Nuclear Blast, a convivência com gente profissional e do ramo para dar-lhes a base para grandes composições eram a peça que faltava para que o mundo os conhecesse. Com uma formação que ainda não era aquela que os levara ao estrelato anos após, “Enthrone...” é uma obra tão irretocável que não há absolutamente nenhum ponto a se questionar. Cantado em inglês, as letras são, creio eu, as mais malvadas escritas por Silenoz, Shagrath e cia. “Mourning Palace” e “In Death's Embrace” são clássicas absolutas e “Spellbound (By the Devil)” é a minha composição mais marcante, aquela que me fez eu me apaixonar pela banda. “The Night Masquerade”, “Entrance”, “Master of Disharmony” e as mais cadenciadas “Prudence's Fall” e “A Succubus in Rapture” são a prova de que quando os caras são bons, clima interno bom, gente profissional por perto, não tem o que dar errado. Não bastasse essas pérolas musicais, as sessões de gravação ainda geraram o fantástico EP “Godless Savage Garden” lançado no ano seguinte apenas com sobras de estúdio de “Enthrone...” além de algumas faixas ao vivo. Uma obra prima para a eternidade!
OUTROS:
O EP “Devil’s Path” (1996) começou a moldar o Dimmu dos álbuns seguintes ainda sem aquela produção caprichada. Também vale lembrar os ótimos DVDs “World Misanthropy” (2002) e “The Invaluable Darkness” (2008) e “Forces of the Nothern Light” (2017) são perfeitos para dar a dimensão da poderio e tamanho que o Dimmu Borgir alcançou. Como bônus do álbum “Stormblåst MMV”, há também um mini DVD de 5 faixas, item também obrigatório aos fãs.