BETWEEN THE BURIED AND ME
THE BLUE NOWHERE
Shinigami Records/Inside Out Music - Nacional
THE BLUE NOWHERE
Shinigami Records/Inside Out Music - Nacional
Conheci o Between the Buried and Me em "Colors II" (2021), e desde então fiquei impressionado. Era como se eu tivesse encontrado a síntese perfeita entre dois mundos que sempre admirei: o progressivo emotivo e surpreendente do Pain of Salvation e a brutalidade reflexiva do Death de The Sound of Perseverance. Um som brilhante, acanhado e inquieto, que não se encaixava em rótulos fáceis — e justamente por isso me ganhou de imediato.
Quatro anos depois, a banda volta com The Blue Nowhere, e a impressão inicial só se confirmou e se expandiu. O álbum surge como um dos trabalhos mais ousados da banda, o primeiro como quarteto, e abraça a excentricidade sem medo. A proposta é desconcertante: cada faixa é como um quarto dentro de um hotel imaginário, carregando histórias, atmosferas e sentimentos próprios — caos, tristeza, alegria, paz e diversão, onde cada porta aberta revela um universo tão inesperado quanto fascinante.
A estreia com “Things We Tell Ourselves in the Dark” já é um soco criativo: sintetizadores que remetem aos anos 80, grooves dançantes e explosões extremas de metal progressivo coexistem sem pedir licença, estabelecendo a inquietude como regra. Em seguida, “God Terror” mergulha em ambientes industriais, lembrando que, por trás de toda a experimentação, a agressividade metálica ainda pulsa com força. Gritos em meio ao instrumental pulsante e quebrado — eu só consigo fechar os olhos e imaginar quão incrível isso vai soar ao vivo.
“Absent Thereafter” talvez seja o maior exemplo de como a banda transforma contrastes em narrativa. São mais de 11 minutos de passagens que vão do bluegrass a sopros inesperados, passando por riffs brutais — e ainda assim tudo soa natural, como se cada elemento tivesse o seu lugar na construção do todo.
As três primeiras faixas consomem basicamente 30 minutos de duração. Parece muito, certo? Errado. A banda entrega uma arquitetura tão singular que tudo passa como um piscar de olhos. E então vem “Pause”, a quarta faixa. Diferente do turbilhão das anteriores, ela é literalmente uma pausa: menos de três minutos de serenidade, uma espécie de respiro etéreo que dá ao ouvinte tempo para absorver a viagem até ali. É nesses momentos que o conceito de “hotel sonoro” ganha ainda mais sentido — há quartos caóticos, há corredores estranhos, mas também há o espaço do silêncio e do descanso.
As letras, por sua vez, refletem a vida moderna: o isolamento, as telas que nos cercam, a confusão mental e a falsa paz em meio ao caos. The Blue Nowhere não é um álbum de respostas, mas de reflexões — ele transforma incertezas em música e mostra que a beleza e o colapso caminham em uma linha tênue.
“Door #3” conduz o ouvinte por corredores onde o prog metal se entrelaça com grooves envolventes e desvios de jazz, enquanto os vocais se erguem de todos os cantos — gritos, urros viscerais, ora em linhas limpas que soam quase como um sussurro reconfortante. “Mirror Uncoil” surge como um breve corredor de transição, mas basta um passo para que a porta seja aberta e os guturais anunciem “Psychomanteum”: 11 minutos de pura excentricidade em alta definição. Intensa e detalhada como se um quebra-cabeça estivesse sendo montado diante do ouvinte. O peso inicial é esmagador, mas logo se dissolve em passagens delicadas e cheias de nuances, como se brutalidade e sutileza disputassem o mesmo quarto do hotel.
Na parte final, o álbum revela suas surpresas mais emocionais. A faixa-título se arrisca em territórios quase radiofônicos, mas carrega uma força melódica que emociona sem perder a estranheza. Já “Beautifully Human” fecha o ciclo em grande estilo: épica, grandiosa e, ao mesmo tempo, permeada por uma humanidade que ecoa além do progressivo — soando imensa sem perder o foco.
The Blue Nowhere não é um álbum fácil, mas talvez essa seja sua maior qualidade. Ele reafirma a coragem de uma banda que não se limita e que continua traduzindo a loucura do cotidiano em arte.
William Ribas


 
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