sexta-feira, 26 de janeiro de 2024

REBEL ROCK ENTREVISTA - AS THE PALACES BURN

 




A banda catarinense As The Palaces Burn vem desde 2019 construindo uma sonoridade única e repleta de personalidade dentro da cena do Heavy Metal no país. Após seu debut “End’evour”, o quarteto - formado por Alyson Garcia (vocais), Diego Bittencourt (guitarra), André Schneider (baixo) e Gilson Naspolini (bateria) - lançou em 2023 o arrebatador “Drowning Into Shadows”, sendo merecidamente destacado pela imprensa especializada como um dos melhores álbuns do ano – inclusive por este que vos escreve, conforme apontei na seleção de fim de ano da Rebel Rock. Notavelmente com uma identidade sonora e estética mais incisiva, o disco que contou com a produção do lendário Adair Daufembach, além de ter sido mixado no próprio Daufembach Studios em Los Angeles, é uma obra a qual concentra uma mescla de estilos que despontam do Heavy Tradicional, passam pelo Thrash e até flertam com o Nu Metal, criando um som poderoso e original. Ainda que nomes como In Flames, Nevermore e Soilwork sejam rememorados na audição, não tem outra maneira de definir: As The Palaces Burn soa mesmo como As The Palaces Burn! Aproveitando o momento no qual a banda colhe os frutos do excelente lançamento, a Rebel Rock teve a oportunidade de bater um papo com o vocalista Alyson Garcia e Diego Bittencourt sobre temas como o último álbum, momento da carreira, futuro e como eles enxergam o cenário atual do heavy metal no Brasil.

Gregory Weiss Costa

Rebel Rock: Inicialmente, antes de falarmos de “Drowning Into Shadows”, queria saber da origem do grupo, de como surgiu à ideia para formar a banda e por onde tudo começou?

Diego Bittencourt: Todos nós já tínhamos uma caminhada longa em outras bandas. O Alyson vinha do Enforcer, eu estava na Symbolica e passávamos por um momento de ressignificação, de buscar outra sonoridade e não fazer disso apenas mais projeto, e sim, fazer uma banda para enfim acontecer. Tanto que nos primeiros singles da banda, eu não os via com a identidade que enfim queria, pois mesmo que fossem músicas minhas, elas foram pensadas com o propósito de um possível segundo disco do Symbolica e, como esse não ocorreu, eu usei-as para o As The Palaces Burns. Depois, quando saiu o “Ende’vour,” eu percebi que por ali tudo começou a trazer mais o que eu estava pensando como projeto de banda há um tempo.

Alyson Garcia: É exatamente isso! Tanto que quando o Diego me chamou - somos amigos de muitos anos - foi justamente o que ele disse: “agora é uma banda para fazer acontecer”. E isso começou assim mesmo: sentíamos que acertamos o passo, estávamos fazendo bons shows, vendo a galera cantando nossas músicas, mas, infelizmente, fomos interrompidos nessa caminhada por ser a época da pandemia.

Rebel Rock: Como aconteceu o processo de composição e construção do “Drowning Into Shadows”?

Diego Bittencourt: Em termos de composição, o álbum trouxe muitas coisas pessoais que eu vivi, que até mesmo percebi na sociedade. O álbum tem essa visão das emoções mais pesadas que o ser humano traz, coisas como depressão ou ansiedade, por exemplo. Eu poderia te falar, faixa a faixa, das minhas experiências as quais me fizeram compor. Talvez músicas como Into Emotions ou Obbey sejam mais claras. Outras, como Lord Underrated – apesar do que muitos pensam, não tem nada a ver com Deus – pois, talvez, essa questão da religiosidade esteja mais evidente em sons como For The Weak. Músicas como As Deep As A River é uma história de vida que virou música, possivelmente uma das mais importantes que fiz. Agora, há faixas como The Hive em que me inspirei em um livro de um autor brasileiro, Pedro Bandeira, chamado “Na Colmeia do Inferno”, em que o personagem precisa ir morar em uma fazenda e lá ele sofre praticamente o “inferno” nas mãos da avó, uma tirana, e a partir daí, precisa sobreviver nessa nova vida.


Rebel Rock: Sobre o trabalho de produção musical, a banda contou com o lendário Adair Daufembach; como isso influenciou na concretização de “Drowning Into Shadows”?

Diego Bittencourt: Eu conheço e já trabalhei com o Adair há bastante tempo. Logo, ele me conhece e eu conheço o modo de pensar dele - tirando o fato de que ele é uma caixa absurda de ideias excepcionais! Só para teres uma ideia, antes de começar esse trabalho com a gente, ele estava encerrando um trampo com o Megadeth. Nesse sentido, quando apresentei as composições, já havia uma sintonia na maneira de como as coisas seriam feitas. Inclusive, para quem não sabe, o Adair é um grande guitarrista, o que para mim foi incrível, pois ele trazia ideias que se somavam às minhas e faziam total sentido com o que queríamos como resultado final. Outro ponto importante é que o nosso baterista, o Gilson, além se der um dos melhores bateristas que conhecemos, é também um grande produtor musical - tem o estúdio dele e trabalha nisso há anos. Poder contar com ele ao lado da produção só contribuiu para que o álbum chegasse a esses bons resultados e na qualidade a qual justifica o porquê estamos recebendo este bom retorno.

Rebel Rock: Abertamente, vocês declaram que as influências da banda contam com nomes como Iron Maiden, Slayer, Nevermore e vão até lendas como o Rush, tudo em uma grande mescla. A própria “Some of Them Died”, tributo que encerra o álbum, homenageia os gigantes “Dio”, “Van Halen”, “Pantera”, “Depeche Mode” entre outros, e é uma bela prova das inspirações do grupo. Ainda assim, é perceptível uma originalidade bem distinta no som do As The Palaces Burn. Como vocês definem seu estilo? Seria enquadrado no que está sendo designado de “metal moderno”?

Diego Bittencourt: Esse rótulo é relativo. Bandas em que buscamos inspiração nessa linhagem, como o Fear Factory, surgiu em 1989. O Nevermore é de 1994. O Korn, que é uma banda de 1993, foi uma das minhas inspirações de sonoridade de guitarra para “Drowning Into Shadows” - pois queria aquele timbre do último álbum deles [Requiem de 2002]. O que talvez tenha mudado é a estrutura de se fazer música no que se entende como “moderno”, quebrando aquele modelo de bandas como o Iron ou o Judas, que são tipicamente lembradas como verso, refrão, solo, verso, refrão! E tudo bem, porque cada banda deve soar como quiser. Eu não digo que fazemos metal moderno, mas acredito que fazemos um som que está sim alinhado a tendências de mercado - ainda que estejamos longe de estar no mainstream do mercado. O que eu posso dizer, no entanto, sobre nossa identidade, é que não somos, individualmente, uma banda em que cada membro começou agora. Eu mesmo tenho 20 anos de estrada, já consigo ter uma noção do que é o meu som e o que são as minhas influências – e posso dizer isso também pelos outros membros. Logo, o As The Palaces Burn já nasceu com um som mais amadurecido, por assim dizer. Se eu fosse querer fazer o som como eu pensava antigamente, eu teria feito guitarras como as do Malmsteen, porque queria tocar exatamente como ele (risos)! Porém, hoje, com o tempo, com mais idade, tenho uma visão bem mais distinta do que é fazer um som com mais identidade e com mais originalidade.

Rebel Rock: Sobre “Drowning Into Shadows”: o álbum tem recebido elogios e a atenção da maior parte da imprensa especializada, sendo regularmente lembrado como um dos melhores álbuns do ano – ainda mais que em 2023, bandas icônicas como Angra, Torture Squad, Nervosa e Crypta também lançaram seus trabalhos. Ainda assim, vocês, mesmo com a caminhada recente, por assim dizer, estão ao lado desses nomes, apresentando um dos grandes e melhores lançamentos de 2023. Como foi receber e perceber tudo isso?

Alyson Garcia: Quando nos preparamos para registrar o novo álbum, queríamos de fato colocar a banda entre os destaques do cenário. O feedback das mídias especializadas tem sido muito positivo. Isso enfatiza que estamos trilhando as etapas certas para uma consolidação. Atualmente, a banda possui uma gravadora italiana, a Rockshots records, que lançou e distribuiu o disco para a Ásia, América do Norte e Europa. Com isso, também estamos com o trabalho circulando lá fora, o qual já vem rendendo boas críticas. Este álbum não foi feito do dia para a noite. Pensamos em cada um dos detalhes, desde o lançamento dos singles, à produção dos vídeos clipes, ao cuidado com as redes sociais. Verdadeiramente, estamos buscando imprimir qualidade em tudo.

Rebel Rock: Uma curiosidade: qual é a origem do nome da banda As The Palaces Burn?

Diego Bittencourt: Não tem nada a ver com o nome da música do Lamb of God (risos). O nome veio mesmo por causa do cenário de polarização política o qual o Brasil estava vivendo recentemente. Eu via amigos brigando e dividindo-se em opiniões extremadas em virtude do clima antagônico que acontecia no país, e isso coincidiu justamente na época em que a banda surgiu. Nós, particularmente, não nos preocupamos em momento algum de expor nossos lados partidários ou políticos; a banda não trata disso. Entretanto, eu pensei mediante a tanta confusão que se via: “deixem os palácios queimarem”, eu só quero fazer minha música!

Rebel Rock: A banda é composta por um time de peso. Como eu disse anteriormente a vocês, respeito máximo a quem fez cover de “Hall of The Mountain King” do Savatage e “Abigail” do King Diamond, o que só mostra o calibre do grupo. No entanto, eu preciso destacar que o As The Palaces Burn conta com um dos nomes mais destacáveis da bateria brasileira, Gilson Naspolini, o qual além da exímia técnica ficou bem conhecido do público brasileiro pelas participações nas lives do Aquiles Priester, na icônica TV Maldita. Como é ter um nome como ele no grupo?

Alyson Garcia: É bem como se imagina. Trata-se de um ser humano e baterista extraordinário. Além da técnica absurda, como dissemos, ele também é produtor e tem uma visão por cima de tudo que se faz e se precisa em uma música. As ideias dele são sempre mais do que assertivas, não só para a bateria – que como disse, trata-se um monstro! – mas também se encaixam perfeitamente para os processos de composição e gravação. Ele conhece como poucos as etapas de como se fazer e construir um trabalho de excelência.

Rebel Rock: Para finalizar, como a banda enxerga o atual cenário do heavy metal brasileiro e pensa no próprio futuro diante disso?

Diego Bittencourt: Como eu te disse, nós temos noção que o nosso som não é mainstream e que já entramos nessa sabendo das dificuldades típicas de ser uma banda de heavy metal no Brasil. Ainda assim, eu sei que o que estamos propondo flerta com as tendências que estão surgindo e que é possível dialogar com as novas gerações. Todavia, o que eu percebo é que a cena não está se renovando. Notamos que o cenário do metal atual - e percebemos isso quando vamos a um show - parece estar mais voltado para públicos com a média etária por volta dos 40 anos. Apesar do acesso hoje ser mais fácil, ele não chega a novas gerações. E quando eu me refiro a isso, sequer penso em nomes consagrados como Edu Falaschi ou Sepultura, mas bandas de extrema qualidade e de portes menores, como o Hibria, por exemplo, que despontou anos atrás para o mundo como uma das melhores bandas brasileiras – e que mesmo que continuem sendo uma das grandes forças que temos no metal nacional - infelizmente, apesar disso, ainda toca basicamente para o mesmo público de seu começo. É claro que as bandas estão com cada vez mais qualidade, mais produção, mas certamente algo precisa ser feito para renovar o espaço e as gerações.

Alyson Garcia: Vemos um futuro ainda mais promissor após o lançamento de "Drowning into Shadows". Seguiremos divulgando o recente álbum através das apresentações e imprimindo qualidade em tudo que fizermos. Diante de um cenário rico de muitas bandas e de artistas com qualidade acima da média, tenho certeza que nosso trabalho será reconhecido.



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