sexta-feira, 23 de junho de 2023

HOST - IX

 

HOST
IX
Shinigami Records/Nuclear Blast Records

Antes de você clicar no play para ouvir “IX”, projeto paralelo do vocalista e do guitarrista do lendário Paradise Lost, Nick Holmes e Greg Mackintosh, respectivamente, precisamos voltar no tempo, lá pelos idos de 1997, para enfim entender a gênese desse curioso trabalho que surge agora em pleno 2023.

Nessa viagem ao tempo, vamos encontrar no percurso a banda inglesa em seu auge, após o lançamento do icônico – e talvez melhor trabalho de sua história – Draconian Times, título o qual colocou o Paradise Lost em uma posição como um dos maiores, mais respeitados e mais celebrados grupos do estilo gothic/doom metal.

Por isso, quando em 1997, os mesmos caras resolveram mudar/inovar o estilo em uma vertente mais tecno, vocais menos crus e com efeitos, uso de sintetizadores e baterias eletrônicas, ideias experimentadas no inusitado One Second, a base de fãs e a crítica especializada ficaram divididas e indagadas com a súbita ousadia.

No entanto, é no trabalho seguinte, de 1999, intitulado Host, que a banda chuta o balde e simplesmente rompe abruptamente com a sonoridade metal e abraça, com ênfase, a sonoridade eletrônica. Considerado o álbum mais controverso da banda, Host, provocou a ira e a debandada de muitos fãs mais tradicionais do estilo, justamente por ser um disco atmosférico, eletrônico e até mesmo pop em algumas trilhas, nada parecido com aquela banda precursora do death doom das antigas.

Sabemos, no entanto, que a banda após isso ressignificou-se mais algumas vezes, retornando inclusive nos últimos álbuns ao estilo que os consagraram, e parecendo ter, enfim, abandonado aquela fase mais Depeche Mode ou New Order. Porém, se o Paradise Lost tivesse seguido nessa linha, como a banda estaria soando hoje? Talvez, a resposta venha nesse projeto de dois membros do Paradise, cujo nome Host faz clara menção à polêmica fase.

Finalmente, após esse passeio, vamos enfim falar sobre o “IX”. Vindo de duas mentes consolidadas em um estilo que praticamente fundaram, além do notório alto teor de conhecimento musical, era previsível que o trabalho não poderia soar ruim. Muito pelo contrário. O álbum condensa o lado sintético das experimentações tecnos com a pegada orgânica e sombria que a dupla carrega em suas essências. Esqueça o experimentalismo do final dos anos 90 que ambos fizeram com sua banda principal no homônimo álbum; “IX” é sim um álbum atmosférico e de viés eletrônico, mas profundamente mais maduro e bem produzido. Trata-se de um novo horizonte musical a ser explorado.

Ainda assim, não se engane. “IX” é um álbum eletrônico – ainda que obscuro e austero – que não vai remeter ao que o Paradise Lost faz na atualidade. Vá escutar Host com ouvidos a fim de uma nova experiência musical, com o gosto agridoce e nostálgico da sonoridade eletrônica e synthpop dos anos 80. Posso dizer – ainda usando o pano de fundo do Paradise Lost – que “IX” permanece como o elo perdido entre Host e Believe in Nothing. É um trabalho simplista, direto e, aparentemente, despretensioso. Acima de tudo, o álbum tem valor próprio e cria sua própria viagem. As músicas de abertura “Wretched Soul” e “Tomorrow’s Sky” deixam isso claro. Jogam com sentimentos futuristas e nostálgicos, quase que servindo de paleta para o que se espera do álbum como um todo. Você vaga por sons em sequência, como a fugaz “Divine Emotion e a cheia de adrenalina “Hiding From Tomorrow” sem sentir a transição. Há momentos contemplativos como “Inquisition” e dançantes (!) como “My Only Escape”.

Contudo, acredito que a intenção do Host seja exatamente essa. As faixas individuais se entrelaçam harmoniosamente para formar um todo perfeito. Holmes e Mackintosh equilibram perfeitamente a escuridão e a luz enquanto criam uma variedade de humores, música após música. “IX” consiste em uma espécie de experiência totalmente cinematográfica destinada a fluir ininterruptamente do início ao fim. Mesmo que exemplos como “A Troubled Mind” e “Instinct” sejam concorrentes aos destaques mais brilhantes do disco, a concepção de Host lida claramente com um fluxo contínuo que apenas endossa a atmosfera de um trabalho sólido e indivisível, a ponto de, caso você se permita ouvir a obra isoladamente, ignorando ressonâncias do Paradise Lost, você irá se surpreender positivamente – ainda mais se o estilo realmente agrada aos seus ouvidos.

Nessa premissa, mesmo que você ouça “IX” sem conhecer os detalhes de sua criação, a intuição lhe dirá que se trata da obra de dois geniais compositores, alinhados ao que é e ao que já foi tendência, dotados de extremo bom gosto. Como mencionei ao início desse texto, você percebe que está escutando algo extremamente bem pensado e bem produzido, sem arroubos experimentais. Coesão e consistência. Quantas vezes esperamos por isso em uma música? E sejamos sinceros: poderíamos esperar algo menos do que excelente vindo da música de Greg Mackintosh combinada com os vocais e letras de Nick Holmes? Conforme esperado, a química entre esses dois artistas faz toda a diferença para tornar o “IX” memorável.

O irônico aqui talvez seja crer que o vocal e o guitarrista do todo poderoso Paradise Lost gostem e façam música eletrônica com excelência. “IX” é um grande álbum e o projeto Host tem potencial suficiente para caminhar paralelamente pelas próprias pernas, entretanto, não é um trabalho que irá agradar a todos ouvidos. Porém, é capaz de causar um impacto significativo porque tem o poder de falar com todo tipo de ouvinte. A sonoridade e conteúdo tratados aqui sempre ressoará em alguma época ou espaço, o que já faz, por todo o contexto de “IX”, um álbum que já nasceu icônico.

Gregory Weiss Costa




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