LANCER
TEMPEST
Shinigami Records/FireFlash Records - Nacional
Quando eu escuto por aí – e não é pouco! – que o heavy/power metal tradicional morreu, eu apenas sorrio com desdém. Conheço particularmente bem o meu estilo predileto, desde o gigantesco Helloween até bandas cujos nomes são tão obscuros que nem menciono. Tenho propriedade: o power metal está vivo e passa muito bem, obrigado! Nessa linha, já sei o que vou responder quando ouvir mais uma vez essa “pérola”: pegue seus ouvidos e vá escutar Lancer.
Ainda que o grupo sueco não tenha reinventado a roda ou extrapolado criativamente o estilo, ouvir a banda formada por Jack L. Stroem (vocais), Per-Owe “Ewo” Solvelius (guitarra), Frederik Kelemen (guitarra), Emil Öberg (baixo) e Pontus Andrén (bateria) é uma audição segura e coesa de tudo que se aprecia no gênero. Dessa forma, podemos contar com esse mesmo sentimento ao apreciarmos seu último álbum, “Tempest”, lançado neste ano. Estamos diante de mais uma excelente opção para fãs derivados de nomes como Hammerfall ou Gamma Ray. A própria capa, que traz um corvo voando e transformando uma bucólica e montanhosa imagem em um árduo inverno, remete a artes já vistas em discos de nomes como o Primal Fear ou Sonata Arctica.
A banda que começou em 2012 pavimenta em seu quarto álbum full-lenght mais um ladrilho na estrada cuja curta caminhada percorre. Estamos, pois, diante de um grupo de uma nova leva, que apesar do hiato durante a pandemia, conseguiu trazer “Tempest” ao mundo. Apesar de serem caras novas na cena, os suecos não se aparentam como tal. Investem em um power/heavy metal tradicional, com vocais poderosos, guitarras velozes e melódicas, baixo e bateria promovendo a cozinha típica que tanto gostamos de ouvir. Todavia, vamos enfim focar nossa atenção ao álbum em questão.
Conforme já havia mencionado por aqui, a banda não expõe um leque de arroubos criativos no nicho do conhecido estilo. “Tempest” não irá inaugurar um viés inusitado ao ouvinte, especialmente àqueles acostumados com tantas referências altivas do gênero – como os supracitados Helloween, Gamma Ray ou Hammerfall. Ainda assim, o disco acerta em sua coerência e bom gosto ao compor um trabalho bem firmado e que oportuniza grandes momentos a quem quiser desventurar-se por suas 10 faixas.
A abertura com “Purest Power” é o que você espera em uma faixa de abertura de um álbum de Power Metal. Baixo e bateria em grooves incidentais, guitarras melódicas e quebras de tempo que vão do mais rápido ao mais cadenciado. Um bom começo, ainda assim, não é nem de perto o melhor que o álbum tem para oferecer. Já em “Fan The Flames” as guitarras dobradas e os pratos de Pontus quebrando em momentos pontuais trazem a energia que se esperava na faixa anterior. Vocais e coros remetem ao Hammerfall na era do “Legacy of Kings”, contudo, figuram certa dose de propriedade e autoria particular. Assim, quando se chega na terceira faixa, “Entity”, há uma percepção da textura que o grupo gosta de expressar. Nesse ponto, não é visto a pegada rápida e de speed como uma peculiaridade do grupo, mantendo-se em tempos mais cadentes e riffs construídos mais pelo feeling do estilo do que propriamente pela velocidade. Também há uma sonoridade hard nesse som – algo nada incomum no estilo que por vezes esteve ladeado a nomes como “Europe” ou “Scorpions”. Destaque aos solos emocionais e bem conduzidos da dupla Frederik Kelemen e Per-Owe “Ewo” Solvelius.
“Out of The Sun”, quarta faixa, subverte o ritmo que estava sendo impresso até então pela obra. Aqui a velocidade toma conta e escutamos o ressoar de uma possível – e clara! – influência do grupo – especialmente dos guitarristas: o conterrâneo e “guitar hero” Yngwie Malmsteen. Impossível não remeter essa música aos áureos tempos do citado guitarrista em obras como “Rising Force” ou “Trilogy”. A própria modulação vocal de Jack Stroem lembra a de Mark Boals nos discos mencionados. Aliás, o vocalista do Lancer tranquilamente seria um excelente nome para gravar e acompanhar, em uma possível curva do destino, o lendário Malmsteen.
A próxima faixa, homônima ao título do álbum, “Tempest”, é uma balada que destila o clássico que uma música mais lenta de power metal pode fazer. Temos uma busca emocional do álbum e excelente performance do vocalista. Uma boa faixa, sem dúvidas, com méritos, realmente, de intitular o disco. Ao encerrar, somos levados a faixa-trilha “Corruption” de 36 segundos, que prepara o ouvinte à agressiva próxima faixa, “Blind Faith”. Agressiva, evidentemente, até o refrão, em que a melodia toma conta. Ainda assim, temos uma faixa de riff e síncope firme para sacudir a cabeça do ouvinte. Certamente, em termos de originalidade, umas das mais destacáveis de “Tempest”.
Na continuidade, “We Furiously Reign” investe em teclados para trazer uma faixa que beira entre o épico e o emocional. Há a pegada já ouvida em trabalhos do Stratovarius ou do próprio Malmsteen, mas a forma como é conduzida revela uma organicidade incrível do grupo. Mesmo que eles joguem nos clichês, fazem isso com uma energia única, sendo, para esse que vos escreve, uma das melhores faixas do álbum. O trabalho de guitarra e bateria chegam a um momento que flertam com o progressivo, mostrando à audiência que o grupo deu duro nessa trilha para criar sólidos relevos e brilhantes nuances. Certamente, uma das melhores surpresas do álbum.
E falando em excelentes surpresas, “Eye For An Eye”, penúltima faixa, traz após as rufadas da caixa de Pontus Andrén, um duo de riffs e solos de guitarra de arrepiar a pele de quem é fã do gênero. Uma pegada entre o progressivo e o melódico, até descambar no refrão grudento que apenas esse estilo pode conceder. Temos aqui a energia e o potencial do grupo, talvez mal posicionada no final do disco. Indubitavelmente, essa música teria grande potencial de servir como a própria abertura de “Tempest”, porém não irei questionar a liberdade artística do grupo ou de sua produção.
O álbum chega ao fim com “The Grand Masquerade”. Trabalho de violões, atmosfera progressiva e solos cheios de energia emocional com o vocal atingindo altos tons. Essa música trouxe-me uma reflexão de que o grupo foi cedendo a uma vertente mais progressiva nas últimas faixas, mas pode ser, talvez, uma mera coincidência. Temos um ritmo mais cadenciado, a volta dos violões em pontos estratégicos assim como acirrados duelos de guitarras. O Lancer soube aqui dar ao ouvinte uma música de excelente instrumental e vocal, uma belíssima figura para encerrar o trabalho. Curiosamente, as faixas que encerraram “Tempest” revelaram-se minhas favoritas.
Sem adornos de magnitude ou de originalidade, entretanto, com todos méritos e aplausos de excelência, temos em “Tempest” a confirmação de que o Lancer é um grupo de extremo talento técnico e sonoro, um conjunto que faz power metal com todo o respeito que o gênero impõe. Em sua curta caminhada, a banda sueca imprime com propriedade o que sabem fazer, sendo - por que não? - uma revelação no estilo. Olhos e ouvidos atentos, pois o Lancer tem todos requisitos e qualidades para tornarem-se um nome tão grande quanto a todos os outros que por ventura rememoramos ao ouvir suas ótimas músicas.
Gregory Weiss Costa
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